quinta-feira, 20 de junho de 2013

"A Sangue Frio", de Truman Capote

Numa manhã de novembro de 1959 Truman Capote se deparou com uma pequena nota no The New York Times sobre o assassinato de toda uma família, numa pequena cidade do estado do Kansas. Inspirado pela brutalidade e o mistério que envolvia o caso na época, decidiu se locomover até o local do crime para escrever não uma reportagem, mas sim um livro sobre o assunto. Truman -- que nesse momento já era conhecido e aclamado pela sua mais famosa novela, "Bonequinha de Luxo" -- viu ali uma oportunidade de iniciar um novo gênero literário, a "literatura de não-ficção". Esse novo gênero tinha como premissa, assim como o nome sugere, unir realidade e literatura. 

Holcomb era mais uma daquelas típicas cidades pacatas do interior dos Estados Unidos, onde seus moradores estavam longe de qualquer suspeita. O casal Clutter e seus dois filhos estavam estabelecidos por aquela região havia décadas, e mais tarde foram descritos pelos vizinhos como "as últimas pessoas na face da Terra que mereciam ser assassinadas". Infelizmente fatalidades acontecem. Numa madrugada de um sábado comum, dois homens entraram na residência da família acreditando que ali havia um cofre -- já que eram donos de uma grande fazenda. O que eles não esperavam é que há muito o sr. Clutter só pagava suas contas com cheques, e tinha em casa uma quantia um pouco maior que 40 dólares. Decididos a não deixar testemunhas oculares, Dick Hickock e Perry Smith, assassinaram com tiros os 4 moradores da casa.
Família Clutter

Nos dias que se passaram toda a população da cidade entrou em pânico. Literalmente da noite para o dia ninguém mais era confiável. Mesmo que essa descrição seja digna de um romance barato de terror, essa era a realidade dos 200 habitantes de Holcomb. Houve famílias, inclusive, que foram embora da região. A partir de um depoimento de um presidiário, que havia sido funcionário do sr. Clutter há dez anos, chegaram aos assassinos. Dick Hickock tão preocupado em não deixar nenhuma testemunha ocular, esqueceu da testemunha principal: seu ex-colega de prisão, que havia lhe contado sobre a família, onde ela morava e sobre o fatídico cofre. 

Nos 4 anos que se seguiram, Hickock e Smith foram de julgamento a julgamento, sempre pedindo uma apelação ao juiz. Até que em março de 1965 o juri chegou à resposta final: os condenados eram culpados do assassinato de 4 pessoas e teriam como punição a pena máxima, a morte por enforcamento. Capote acompanhou todo o caso, entrevistou vizinhos e moradores de Holcomb e teve acesso aos assassinos, criando com eles uma amizade.
Dick Hickock e Perry Smith

A madrugada de 14 de abril de 1965 foi a data escolhida para a pena ser consumada. No local era permitido a presença de 20 pessoas, os condenados tinham o direito de convidar uma pessoa para assistir execução. Ambos escolheram Capote. Trumam que nesse momento já era íntimo dos assassinos -- chamava-os afetuosamente de "os garotos" -- aguentou ver apenas uma das execuções, a de Dick Hickock, que foi o primeiro a ser enforcado. Essa experiência marcou o escritor para o resto da vida. Mais tarde ele contaria que não conseguiu escrever sobre a morte deles pelos próximos dez dias. 
Truman Capote

"A Sangue Frio" foi o nome que Capote escolheu para seu livro, que virou instantaneamente um best-seller, e consagrou-o como o melhor escritor norte-americano de sua época. Capote jamais voltou a concluir um romance e faleceu 20 anos após o lançamento do livro. Mesmo envolto em controvérsias, sobre a veracidade dos fatos e diálogos narrados no livro, "A Sangue Frio" segue sendo um clássico contemporâneo.

Dois anos após o lançamento o livro recebeu uma adaptação cinematográfica, que permaneceu com o mesmo título e você pode ver o trailer: aqui.

Em 2005 e 2006 dois filmes sobre Capote na época em que escreveu "A Sangue Frio" saíram. Primeiro "Capote", que rendeu o Oscar de Melhor Ator a Philip Seymour Hoffmann, por sua interpretação de Truman Capote. E um ano depois "Infamous", que não recebeu nenhum Oscar porém há quem diga que a interpretação de Toby Jones é melhor que a do concorrente.

Sempre houveram rumores de que enquanto o livro foi escrito, Capote e Perry Smith tiveram um relacionamento, e ambos os filmes abordam também esse tema. Enquanto em "Capote" essa relação fica com ares de platonismo, em "Infamous" eles chegam a se beijar. "Infamous" é bem humorado, com um Truman Capote que se veste afeminadamente, e tem um elenco estelar: Sandra Bullock, Daniel Craig e Gwyneth Paltrow, para citar alguns. Já "Capote" não tem essa cara toda de Hollywood, e é um tanto mais dramático, mas ainda assim meu favorito! 

quarta-feira, 5 de junho de 2013

"Quem é você, Alasca?", de John Green


Quando se tem 20 anos de idade -- meu caso -- é estranho dizer ou pensar "quando eu era adolescente", porque de certa forma sou e não sou mais. A gente cresce, passa por muitas coisas, adquire rotinas tão cheias quanto de qualquer pessoa "adulta" e por aí vai. Isso, para quem lê com frequência, também reflete nas suas leituras. Ano passado, depois de ler a trilogia "Jogos Vorazes", decidi não mais ler livros YA (Young Adults, caso não saiba), por motivos de (1) eu estava achando muito vago, (2) quem sabe eu nunca tenha sido um adolescente convencional, (3) já havia passado pelas loucuras de meu primeiro amor há algum tempo, e esse assunto é obrigatório nesse tipo de livro e (4) nem vamos entrar em questões de triângulos amorosos, traições de amizade, pé na bunda e etc.

Alguns meses após o episódio Jogos Vorazes lembro de que em quase todos os jornais e revistas que eu abria tinha uma reportagem dedicada ao "sick-lit", gênero literário dentro do YA, que tem como característica assuntos como câncer, suicídio, depressão entre outros. Essa "doença literária" é um termo pejorativo porém levado a sério, já que nos últimos anos foi um boom de livros lançados que se enquadram nessa categoria. O livro que trouxe o assunto à tona definitivamente foi "A culpa é das estrelas" de John Green, escritor norte-americano, premiado por livros anteriores, nerd assumido que junto com seu irmão Hank Green faz o VlogBrothers -- um canal no Youtube onde eles discutem desde literatura a assuntos sociais. Os seguidores do canal  recebem o título de NerdFighters.

John Green
John Green estreou sua carreira literária em 2005 com "Quem é você, Alasca?", livro que rendeu a ele os mais importantes prêmios de literatura norte-americana. Miles é um adolescente de 16 anos, nerd, não tem amigos e é obcecado por últimas palavras ditas por pessoas ilustres -- por conta disso ele é um leitor voraz de biografias e autobiografias. Num desses livros ele descobre que o poeta François Rabelais disse, antes de morrer, que estava indo atrás de um "Grande Talvez". Inspirado nisso Miles acredita que indo para a escola interna Curver Creek ele encontrará o seu Grande Talvez (mesmo ele não sabendo exatamente o que é). Lá ele faz suas primeiras amizades de verdade, entre elas, a menina mais rebelde do colégio, Alasca. Não preciso contar que ela é o primeiro amor da vida dele também, não é?

O que me fez gostar muito desse livro é que apesar de ter os assuntos obrigatórios de livros adolescentes (primeiro amor, o primeiro beijo, a primeira vez que bebe e fuma, a primeira vez sexual, intrigas etc) também há muitos outros assuntos que até o presente momento eu nunca havia lido em outro livro para essa faixa etária. Tamanha foi minha surpresa quando descobri que um assunto constante entre os personagens era o contraste entre vida e morte, que mesmo com tão pouca idade já se questionavam sobre o sentido da vida -- isso é, se de fato tem algum. Outra coisa que gostei muito foi um trabalho passado por um professor, que tinha como objetivo analisar 3 religiões sob o mesmo prisma e explicar a solução que cada uma dava uma determinada questão e o possível porquê de ser.

John Green me deu uma esperança no gênero YA, que eu estava precisando. Pretendo ler mais livros dele (e quem sabe até seguir umas dicas literárias que ele dá no VlogBrothers).




(Obs: John Green, assim como eu, é muito, muito, muito fã de "O Apanhador no Campo de Centeio", de J. D. Salinger. Não é lindo? Não sei se é coisa da minha cabeça mas teve vezes que enquanto eu lia o livro eu achava bem similar a forma que o Miles narra com a forma do Holden Caulfield. De qualquer forma, sendo ou não um plágio de narração, Green está perdoado :)