8 de dezembro de 1980. Por volta das 23 horas. Mark Chapman, 25 anos, está em frente ao edifício Dakota esperando pelo mais ilustre de seus moradores. Aquele seria seu segundo encontro com o cantor do dia. Horas mais cedo, Chapman havia conseguido um autógrafo, mas dessa vez os motivos que o levavam até lá eram maiores do que a ligação entre fã e ídolo. Sem demora, ele vê virando a esquina o casal John Lennon e Yoko Ono. Sem dizer nada ele saca um revolver do bolso e dispara cinco tiros. Quatro deles atingem Lennon, que faleceu no local. Chapman, contrariando o que qualquer outra pessoa faria numa situação como essa, senta ao lado do corpo e volta a sua leitura do livro “O Apanhador no Campo de Centeio” de J.D. Salinger. Mais tarde, já preso na delegacia, quando chamado à dar seu depoimento, diz que – entre outros motivos – quem o fez matar o cantor fora Holden Caulfield, o personagem de 16 anos do livro.
Graças à esta fatalidade e o depoimento de uma pessoa claramente desestabilizada mentalmente, “O Apanhador no Campo de Centeio” ficou com a fama de “o livro dos assassinos”. Este salvo conduto – de ter um mandante (mesmo que literário) – foi usado em pelo menos outros 3 casos de assassinato ou tentativa de assassinato envolvendo sempre pessoas ilustres. Mas afinal de contas, o que de tão pertubador há nesse livro?
A resposta é simples: sentimentos triviais na vida de um adolescente. Holden Caulfield se vê expulso do colégio pela terceira vez, em véspera de Natal. Decidido de que não irá mais ficar nem um dia no colégio — já que era um internato — ele foge na mesma noite em que sabe da notícia. Vendo que ainda faltariam 4 dias para o seu regresso para casa, por conta do recesso, Holden decide passar esses dias nas mediações de Nova York — onde sua família mora. O que a primeira vista parece ser só mais uma história de um adolescente rebelde, se mostra, na verdade, muito mais profundo por conta dos pensamentos do protagonista.
Holden, como ele mesmo afirma, vem de uma família burguesa. Tem dois irmãos e uma irmã. Não fica específicado quando, mas sabe-se que um de seus irmãos (o mais novo) faleceu por conta de uma leucemia. Além disso, Holden sente-se muito solitário até mesmo quando está rodeado de pessoas, e tem a certeza de que ninguém o escuta ou se importa com ele. Esses fatos, somados, talvez explique a confusão que é a cabeça do adolescente.
O livro foi publicado 30 anos antes do assassinato de John Lennon, mas ganhou repercusão mundial após o caso. Antes disso, o livro por si só já era polêmico por conta do uso abusivo de gírias e de questionamentos sobre a vida sexual do personagem. Coisas que hoje em dia não assustariam ninguém, mas lembremos que nos referímos à decade de 50. Toda a trivialidade de sentimentos, mesclado com a profundidade destes, fez uma legião de fãs não só para com o livro, mas para com o escritor, J.D. Salanger, que conseguiu ser mais enigmático que seu personagem.
Apesar de Holden já não ser mais o tipo de personagem que adolescentes nos dias de hoje têm como herói — muito pelo contrário, exerceria o papel de anti-herói –, e a escrita de Salanger não ser das mais convencionais, são facilmente identificáveis os motivos que levaram o livro a ser considerado o quinto melhor do último século. E também quando você lê a última página, é muito fácil de se identificar com Holden quando ele diz que gostaria de poder ligar sempre que quisesse para seus escritores favoritos. Salinger já entrou pra minha lista.
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